Triste o país que desvaloriza os seus sucessos e se alimenta dos seus fracassos. Que se delicia a escutar e a espreitar a sua caminhada para o caos social e político, na ilusão de que está a fazer justiça e enquanto vai empobrecendo. Portugal está assim, como um louco a destruir tudo à sua volta.
Não ficará pedra sobre pedra em nenhuma instituição, é o que parece termos prometido a nós próprios. Governo, Tribunais, Banco de Portugal... Partidos e tribunais, políticos e juízes, governantes e opositores, empresas e gestores, jornalistas... O louco que se soltou no País esmaga, deliciado, a credibilidade de tudo e todos sem que encontre pela frente alguém que lhe faça frente.
Tudo parece desaguar no vazio que se foi gerando na Justiça. Porque a justiça não funciona - ou não funciona como cada um acha que deve funcionar -, façamos então justiça pelas nossas próprias mãos.
E no meio da maior crise económica e financeira desde a Segunda Guerra Mundial, discutimos escutas que quem tinha a obrigação de manter longe dos ouvidos de todos colocou na praça pública. A intenção de quem o fez, desconhecemo-la. Para nós, simples cidadãos, está criada a ilusão de que assim fazemos a justiça que a Justiça não faz.
Sim, estamos todos fartos de ver figuras públicas indiciadas sem que a mão da Justiça chegue até elas. No futebol, na política, nas empresas... E se nós, que assistimos de longe a esse espectáculo, estamos cansados e desalentados, como estarão aqueles que têm como trabalho investigar, acusar e fazer justiça? Revoltados? É a revolta que explica ter-se caído na tentação de fazer justiça com o que se tem à mão, o "You Tube" ou os jornais? Compreende-se mas não se pode apoiar.
O mau funcionamento da Justiça gerou justiceiros que, apoiados em cumplicidades variadas e inteligentes manipulações do sistema, condenam com trânsito em julgado, e sem direito de defesa ou resposta, todos quantos caiam numa escuta.
Todos queremos e temos o direito de saber. Mais informação é sempre melhor que menos informação. Mas cada condenado na praça pública que vai caindo é mais uma estrutura que se destrói na construção da nossa sociedade. Lentamente, com mesquinhas vinganças diárias que pensamos ser justiça, caminhamos para a nossa autodestruição.
Hoje satisfaz-nos ver apedrejar no espaço público quem julgamos saber que violou leis fundamentais. Amanhã, quando as pedras caírem por todo o lado, e a todos acertarem, clamaremos pela Justiça que julga com provas. E nessa altura, se não mesmo já, neste momento, a Justiça já estará totalmente destruída.
Contrariar o caminho que estamos a seguir parece quase impossível. O sistema parece estar em dinâmica autodestrutiva. É no interior da Justiça que está o motor dessa autodestruição. Estamos a assistir à reacção da Justiça contra a sua própria incapacidade de fazer Justiça.
O louco que a Justiça soltou tem a força e o ânimo para nos empurrar violentamente para fronteiras mais negras que a actual mais grave crise económica e financeira das últimas seis décadas.
Quem nos poderá salvar do louco que se soltou? Apenas a Justiça o poderá prender.
Este artigo vai ficar para a história destes dias negros.
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